2009


O ano acaba... com os reflexos das luzes da cidade aprisionados nos charcos deixados pela fria chuva de Inverno. 


Saio de casa porque não quero ficar sozinho. Sempre que olho à minha volta vejo todo o espaço que está ainda por preencher. Preciso de (me) esquecer.

Resignado, desço a avenida devagar... sem pressa. 

Afinal, com o cair da noite, as nuvens já não parecem tão assustadoras. 

Estranhos passam por mim. Sozinhos, perdidos nos seus pensamentos. Fico com a ideia de que também eles não têm para onde ir e se limitam a vaguear... à espera de encontrar algo... ou alguém com quem partilhar mais uma noite.


Sigo, misturado com as sombras, por entre sentimentos e pensamentos.


No largo, junto à estátua, um pequeno grupo de estranhos reúne-se para a última refeição à porta de uma carrinha de uma instituição social. São eles os donos da cidade... aqueles que se escondem durante o dia e vivem durante a noite, guardando os cantos escuros com a sua presença. 


Passo por eles e oferecem-me o que comer. Não tenho fome. Mas aceito ficar. É estranho perceber que quem menos tem é quem mais se dispõe a partilhar. E aqui partilha-se tudo. A escassa refeição, que é por vezes a única do dia. As experiências de uma vida que já foi boa. O últimos resquícios de humanidade que ficaram depois de tudo o resto se ter pedido. Pouco depois a carrinha abandona-nos. Deixam-nos com votos de um futuro melhor. O grupo dispersa. A data tem tanto de simbolismo como de miséria e os cantos escuros já ficaram sem vigilância por tempo demais.


Continuo a caminhar para lado nenhum. 

Chego ao rio, já bem perto da hora da mudança. Já lá estão grupos de pessoas à espera da contagem decrescente. Garrafas de espumante e copos de plástico. A alegria nos rostos de quem me rodeia é, também ela, de plástico. Fazendo os possíveis por esquecer o quão mau foi o ano anterior e tentando optimisticamente pensar num futuro melhor. 


Chega a hora. O fogo de artifício brilha nos céus da cidade. Os copos de plástico enchem-se. E comemora-se... só não percebo o quê. 


Comem-se as passas. Salta-se de uma cadeira. Sucedem-se superstições e cumprimentos disparados aleatoriamente para amigos e desconhecidos.


E assim começamos mais um ano. Com os bolsos cheios de desejos e expectativas. A chuva, que entretanto começa a cair, espalha alguns salpicos de ambição. E fazemos promessas. Promessas que por vezes nem pensamos cumprir... mas fazemos porque fica bem e porque temos que nos convencer que essa seria a postura certa para uma realidade ideal.


E daqui a um ano vamos estar ali, uma vez mais. Com mais desejos e mais expectativas. A partilhar a mesma alegria de plástico... e a comemorar. 


And this is the day when it all begins... again.



2 comentários:

ruth ministro disse...

Um ano cheio de coisas belas e de sorrisos sinceros, é o que te desejo.

Beijos

Lenin aka JR disse...

Ruth,
Também era isso que tinha em mente... ;)

Muito Obrigado e faço minhas as tuas palavras... até porque coisas belas e sorrisos sinceros nunca são demais.

Beijo.
JR